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FATORES DE RISCO PARA A TRANSMISSÃO DA ANEMIA INFECCIOSA EQUINA, LEPTOSPIROSE, TÉTANO E RAIVA EM CRI

Regiana Araújo Lage1; João Paulo Araújo Fernandes de Queiroz1; Francisco David Nascimento Sousa1;

Edney Giovanni Dias Agra1; Marisa de Alencar Izael1; Regina Valéria da Cunha Dias2,*

1Médicos Veterinários autônomos.

2Professora, Departamento de Ciências Animais, Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA) Mossoró, RN.

RESUMO - O crescimento da prática de vaquejada no município de Mossoró requer um manejo sanitário adequado visando à prevenção de doenças tanto nos criatórios como nos parques. Dessa forma, este trabalho objetivou avaliar a qualidade do manejo sanitário realizado e a notificação sobre a fiscalização sanitária interestadual e em parques de vaquejada do município. Os dados foram obtidos por meio de um inquérito epidemiológico mediante questionário aplicado a 40 proprietários e tratadores, através do qual foi possível observar que o manejo sanitário dessa espécie é bastante deficitário. Tal fato é agravado pela falha fiscalização interestadual e pela ausência de controle sanitário nos locais dos eventos.

INTRODUÇÃO

Atualmente a criação de eqüinos vem ganhando enorme interesse, visto que o cavalo é utilizado em

diferentes formas de atividades, como tração e transporte, em segurança pública e até no tratamento de doenças humanas através da Eqüoterapia (Almeida, 2001). Aliado a isso, o número de animais destinados ao lazer e ao esporte tem aumentado consideravelmente, o que proporciona uma exploração de grande interesse econômico, envolvendo animais de alto valor zootécnico (Lage,

2007).

No município de Mossoró é evidente a presença de vários criatórios eqüestres tendo como finalidade principal o uso destes animais na prática de vaquejadas. Entretanto, o crescimento marcante dessa atividade requer cuidados no manejo sanitário destes animais, tendo em vista a prevenção de doenças como anemia infecciosa eqüina, leptospirose, tétano e raiva, entre outras, tanto nos criatórios como nos parques de vaquejada.

A anemia infecciosa eqüina (AIE) é uma enfermidade cosmopolita, causada por um vírus do gênero Lentivirus da família Retroviridae e acomete os eqüídeos (Issel & Coggins, 1979; Clabough, 1990; Cook et al., 2001). A AIE é um grande obstáculo para o desenvolvimento da eqüideocultura, por ser uma doença transmissível e incurável, acarretando prejuízos aos proprietários que necessitam do trabalho desses animais e aos criadores interessados na melhoria das raças, além de impedir o acesso ao mercado internacional (Almeida et al., 2006). O diagnóstico laboratorial é de fundamental importância para detecção dos portadores da doença, que, de acordo com a legislação (Brasil, 2004) devem ser sacrificados, promovendo o saneamento dos rebanhos. Na região nordeste poucos estudos foram realizados sobre a situação da AIE, entretanto Carvalho Júnior (1998) relatou uma prevalência de 3,36%.

A Leptospirose é uma zoonose bacteriana prevalente em todo o mundo. É causada por espiroquetas da espécie Leptospira interrogans, que apresentam mais de 212 sorovares, agrupados em 23 sorogrupos. Este agente pode afetar animais domésticos, selvagens e humanos, representando, portanto, um importante problema de saúde pública (Barwick ET al., 1997). Pescador et al. (2004) sugerem a leptospirose como causa de problemas reprodutivos também na espécie eqüina. Nessa espécie constitui importante causa de abortos (usualmente ao 6º mês de gestação), nascimento de animais fracos ou prematuros, natimortos e mortalidade neonatal.

Febre, icterícia, problemas oculares e morte por nefrite intersticial têm também sido observadas

(Riet-Correa & Lemos, 2001). O tétano é uma doença infecciosa altamente fatal, causada por toxinas produzidas pelo Clostridium tetani e caracteriza-se por rigidez muscular e morte por parada respiratória ou convulsões, sendo os eqüinos a espécie mais suscetível (Radostits et al., 2002). Trata-se de uma enfermidade de distribuição cosmopolita, sendo mais comum em áreas de cultivo

intenso. Solos intensamente contaminados por matérias fecais contêm elevadas concentrações de esporos de C. tetani. Raposo (2001) afirma que a ocorrência da infecção tetânica no homem e nos

eqüinos é maior nas regiões mais quentes dos vários continentes. Sua ocorrência está também associada às práticas de manejo que submetem vários animais às mesmas condições de contaminação como castrações, colocação de brincos ou vacinações (Nakazato & Brum, 1998).

A raiva é causada por um vírus RNA, do gênero Lyssavirus, da família Rhabdoviridae, é uma das

viroses mais importantes para a pecuária e para a saúde pública no Brasil. Está distribuída em quase todo o mundo, tanto nos animais domésticos, quanto em animais silvestres, que servem como reservatórios por longos períodos (Acha & Szyfres, 1986).

Essa enfermidade tem sido pouco estudada em eqüinos no Brasil. Em São Paulo entre os anos de

1980 e 1994 foram diagnosticados 983 casos de raiva em bovinos e 111 em eqüinos (Peixoto et al., 2000), enquanto que no Rio Grande do Sul de 1978- 1998 foram diagnosticados 12 casos em eqüinos e 77 em bovinos (Riet-Correa et al., 1999). Lima et al. (2005) relatou a ocorrência de um surto de raiva em eqüinos no município de Taipu, zona da mata do Rio

grande do Norte.

Dessa forma, o presente trabalho tem por objetivo suprir a necessidade de informações sobre a

qualidade do manejo sanitário realizado em eqüinos, criados no município de Mossoró e a notificação sobre o grau de fiscalização para entrada destes animais em parques de vaquejada. Com o intuito de indicar as medidas preventivas a serem tomadas pelos criadores no controle e profilaxia das enfermidades em questão.

MATERIAL E MÉTODOS

Os dados foram obtidos através de um inquérito epidemiológico mediante questionário aplicado a 40 proprietários e tratadores de cavalos durante a realização de duas vaquejadas no município de

Mossoró, abordando histórico de ocorrência e os fatores epidemiológicos envolvidos na transmissão

da Anemia infecciosa eqüina, leptospirose, tétano e raiva, assim como as medidas de prevenção por eles adotadas e a inspeção sanitária de seus animais para o ingresso em parques de vaquejadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Anemia infecciosa eqüina (AIE): Dos entrevistados, 28 (70%) afirmaram realizar controle de moscas na propriedade. O controle de moscas na propriedade eqüestre é de extrema importância na profilaxia da AIE, pois a mosca do estábulo (Stomoxys sp.) e alguns mosquitos como o mosquito pólvora (Cullicoides sp.), podem também servir de vetores mecânicos para o vírus da AIE

(Weiblen, 2001).

Ainda, com relação à adoção de medidas profiláticas à AIE, como uso adequado de utensílios e sua

higienização, todos os entrevistados informaram fazer uso adequado de seringas e agulhas e uso individualizado do material de selaria. Quanto à existência de serviços veterinários nas propriedades, 15% dos entrevistados informaram contar com serviços de assistência veterinária

constante em suas propriedades, enquanto que 65% afirmaram contar com estes serviços apenas

esporadicamente e os demais (20%) afirmaram não contar com assistência veterinária de qualquer tipo.

Quanto à realização de exame sorológico constante, apenas 10% dos proprietários e tratadores disseram fazê-lo. Neste aspecto, Santos et al. (2001), durante estudos conduzidos no estado do Acre, encontraram as maiores freqüências de AIE em regiões onde se tem pouco acesso ao diagnóstico laboratorial e à assistência veterinária.

Todos os entrevistados (100%) participam de eventos em outras cidades e estados. Com relação ao

controle sanitário interestadual, 32 (80%) informaram ter sofrido fiscalização. No que diz respeito ao controle sanitário no local do evento, 25 (62,5%) informaram não haver qualquer tipo de controle nas vaquejadas. A legislação brasileira preconiza que o trânsito interestadual de eqüídeos, somente é permitido quando os animais estão acompanhados da Guia de Trânsito Animal (GTA).

Na emissão da GTA para eqüídeo, com 6 (seis) meses ou mais de idade, é obrigatória a apresentação de resultado negativo à prova de IDGA (imunodifusão em gel de agar) e a participação de eqüídeos em leilões, feiras, rodeios, exposições, torneios e demais concentrações destes animais, somente é permitida a eqüídeos com resultados negativos à prova de diagnóstico para A.I.E., independentemente da necessidade da movimentação, interestadual ou não.

O fato da enfermidade ser caracterizada por um grande percentual de portadores assintomáticos

(Issel & Coggins, 1979), induzem os proprietários a não participarem das ações de combate à doença, prescritas em lei, principalmente em relação ao sacrifício imediato dos portadores e à interdição, do trânsito de eqüídeos nas fazendas, até o completo saneamento do foco, fazendo com que a doença se mantenha no campo (Almeida et al., 2006).

Leptospirose:

Dos 40 entrevistados, 20 (50%) admitiram a presença de roedores na propriedade. Algum tipo de

controle de roedores era realizado segundo 28 (70%) entrevistados. O controle de roedores está entre as principais medidas de prevenção e controle de leptospirose. É feito principalmente através de atividades de antiratização, que visam modificar as características ambientais que favorecem a

penetração, instalação e a livre proliferação de roedores por meio da eliminação dos fatores que

propiciem o acesso desses animais ao alimento, abrigo e água. Por outro lado, são também levadas

em consideração, as atividades de desratização, visando à eliminação direta dos roedores pelos

métodos mecânicos e químicos (FUNASA, 2002).

No que diz respeito ao controle sanitário nos locais dos eventos, 25 (62,5%) informaram não haver

qualquer tipo de atividade voltada ao controle de roedores em parques de vaquejada. Deve-se levar em consideração que, nas vaquejadas, há aglomeração de animais muitas vezes de origens diferentes e em condições de saúde inadequadas devido a falta de controle sanitário, o que constituem fatores de risco para a transmissão da leptospirose uma vez que a transmissão depende de condições favoráveis para a sobrevivência do organismo no meio ambiente, do número de animais portadores em uma população e do tempo que os animais portadores abrigam as Leptospiras. A umidade, temperatura e o pH são pontos críticos para a sobrevivência do agente no meio ambiente (Riet- Correa & Lemos, 2001).

Tétano:

Dos 40 entrevistados, apenas 1 informou a morte de um animal por tétano após a participação em

vaquejada. Todos (100%) afirmaram dar atenção especial aos ferimentos dos animais. Esporadicamente o tétano pode ocorrer devido a ferimentos externos ou por lesões internas ou, ainda, em forma de surtos, geralmente após praticas de manejo, submetendo vários animais às mesmas condições de contaminação. Feridas penetrantes nos cascos são portas de entrada comum nos equinos (Raposo, 2001).

Sobre o destino dos dejetos dos animais na propriedade, 16 (40%) admitiram utilizar como adubo em capineira; 13 (32,5%) destinam os dejetos a esterqueiras; 04 (10%) fazem uso de esterqueiras

utilizando também como adubo; 03 (7,5%) mantêm em local isolado na propriedade; 02 (5%) realizam a queima das fezes; e 02 (5%) não souberam informar. Todas as espécies de animais de interesse zootécnico são sensíveis, mas ocorre variação de susceptibilidade, sendo os eqüinos os mais susceptíveis. O tétano tem distribuição mundial sendo que solos intensamente contaminados por matérias fecais contêm elevadas concentrações de esporos de C. tetani. Os esporos podem permanecer latentes nos tecidos por algum tempo e produzir doença clínica apenas quando as condições tissulares favorecem sua proliferação. Essa doença, em geral, ocorre de forma esporádica. A letalidade em equinos varia muito entre áreas, sendo que em algumas, quase todos os animais morrem de forma aguda, enquanto que em outras, a taxa de letalidade situa-se sempre em torno de 50% (Raposo, 2001). Como medida geral de controle, preconiza-se que os animais suscetíveis devem ser imunizados ativamente com toxicóide, toxina precipitada com hidróxido de alumínio e tratada pela formalina. Os anticorpos colostrais podem interferir com a imunização ativa de neonatos. Uma recomendação geral deve incluir a vacinação dos potros aos 2, 3 e 6 meses de idade, seguindo-se uma dose de reforço após 1 ano. Para que sejam assegurados níveis protetores de anticorpos colostrais, as éguas devem receber uma dose de reforço anual de toxóide, 1-2 meses antes da parição. Uma injeção confere proteção em 10 a 14 dias, persistindo por um ano e a

revacinação em 12 meses confere sólida imunidade por toda a vida (Raposo, 2001).

Raiva:

Entre os entrevistados 19 (47,5%) confirmaram a presença de morcegos enquanto que 21 (52,5%) negaram a existência desse animal na propriedade atualmente. Os morcegos podem ser o veiculo mais eficiente de propagação do vírus rábico para os animais de produção, pois eles os agridem

diariamente. Além disso, de acordo com a FUNASA o morcego é o segundo maior transmissor de raiva humana no Brasil. A ocorrência de morcegos nas propriedades rurais, independente da espécie é um fator de risco para a transmissão da raiva, pois tanto os morcegos hematófagos, como frutívoros e insetívoros podem atuar como vetores (Jubb et al., 1993 apud Fernandes, 2001). As espécies hematófagas (Desmodus rotundus, Diphylla ecaudata e Diaemus youngi) são exclusivas da região neotropical e ocorrem, de modo geral, desde o México até a Argentina (Brasil, 2005).

Dos 19 (47,5%), 6 (31,6%) relataram ataques de morcegos a cavalos enquanto que dos 21 (52,5%), 5 (23,8%) informaram já ter ocorrido ataques na propriedade. Dos 40 entrevistados, 39 (97,5%)

afirmaram manter outras espécies animais na propriedade, estando a espécie canina presente em

72,5% delas. A literatura cita que, na raiva urbana, os caninos são os principais vetores desta doença.

Entretanto, a grande densidade de caninos na zona rural aliada a sua alta taxa de reprodução anual são fatores de risco para a transmissão da raiva (Jubb ET al., 1993 apud Fernandes, 2001). A ocorrência da raiva num determinado local depende da existência de vetores. Como a raiva é transmitida principalmente através de mordidas, os hospedeiros mais importantes na transmissão da

doença são os carnívoros e os quirópteros. Os herbívoros não são importantes na cadeia epidemiológica da doença (Jubb et al., 1993 apud Fernandes, 2001). Fernandes (2001), afirma que a profilaxia desta enfermidade deve ser realizada através de programas de erradicação e controle da raiva urbana; controle da raiva silvestre; medidas de transporte internacional de animais; e procedimentos de vacinação prévia e pós-exposição em humanos.

CONCLUSÕES

O manejo sanitário dispensado a espécie equina frente ao crescimento de eventos como vaquejadas é bastante deficitário principalmente no que diz respeito à prevenção e controle doenças infectocontagiosas sendo algumas de caráter zoonótico. Esse fato é agravado pela falha na fiscalização interestadual e principalmente pela ausência de controle sanitário nos locais dos eventos, permitindo a entrada de animais doentes, propiciando a disseminação destas patologias e pondo em risco à saúde humana, principalmente a dos tratadores que mantêm um maior contato com esses animais.

REFERÊNCIAS

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transmisibles comunes al hombre y a los animales. 2ª ed.

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Almeida H.B. 2001. Sincronização do estro e dinâmica folicular

de éguas crioulas submetidas a tratamentos com Norgestomet,

Acetato de Melengestrol e Altrenogest. Dissertação de Mestrado,

Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de

São Paulo, São Paulo. 100p.

Almeida V.M.A., Gonçalves, V.S.P.; Martins, M.F.; Haddad,

J.P.A.; Dias, R A.; Leite, R.C.; Reis, J.K.P. 2006. Anemia

infecciosa eqüina: prevalência em eqüídeos de serviço em Minas

Gerais. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec. 58:141-148.

Barwick R.S., Mohammed HO, McDonough PL, White ME.

1997. Risk factors associated with the likelihood of Leptospiral

seropositivity in horses in the state of New York. Am. J. Vet.

Res. 58:1097-1103.

Brasil. 2004. Resolução número 4/2004. Controle da anemia

infecciosa eqüina no estado de Minas Gerais. Diário Oficial da

União, n.138, seção 1, p.92.

Brasil, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

2005. Controle da Raiva dos herbívoros. Brasília:

MAPA/SDA/DSA, 104p.

Carvalho Júnior O.M. 1998. Anemia infecciosa eqüina-A AIDS

do cavalo. Revista de educação continuada do CRMV-SP, 1:16-

23.

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