As influências do homem no equilíbrio natural do planeta atingiram magnitude sem precedentes. As mudanças climáticas antropogênicas estão associadas às atividades humanas com o aumento da emissão de gases de efeito estufa, de queimadas, com o desmatamento, a formação de ilhas urbanas de calor, etc. A Amazônia desempenha um papel importante no ciclo de carbono planetário, e pode ser considerada como uma região de grande risco do ponto de vista das influências das mudanças climáticas. Segundo Salati (2001), o atual equilíbrio dinâmico da atmosfera amazônica está sujeito a forças de transformação que levam às variações climáticas e podem ser estudadas sob três diferentes aspectos:
Variações climáticas na região podem ser devidas às variações climáticas globais, decorrentes de causas naturais.
Essas mudanças estão relacionadas com variação da intensidade solar, variações da inclinação do eixo de rotação da Terra, variações da excentricidade da órbita terrestre, variações das atividades vulcânicas e variações da composição química da atmosfera, entre outras. Existem registros bem documentados sobre as oscilações climáticas na Amazônia ocorridas durante as glaciações e também de variações mais recentes da temperatura local. Os efeitos do El Niño, que é um fenômeno natural, podem estar incluídos dentro dessa categoria. O tempo de resposta às forças modificadoras pode ser em um período anual, de décadas e milênios. Não há muita coisa que a sociedade possa fazer contra essas tendências a não ser se preparar para minimizar seus efeitos quando houver possibilidade de previsões científicas, como é o caso específico das variações climáticas decorrentes do El Niño e La Niña.
Mudanças climáticas de origem antrópicas, decorrentes de alterações do uso da terra dentro da própria região amazônica.
Tais alterações estão ligadas diretamente ao desmatamento de sistemas florestais para transformação em sistemas agrícolas e/ou pastagem, o que implica em transferência de carbono (na forma de dióxido de carbono) da biosfera para a atmosfera, contribuindo para o aquecimento global, o qual por sua vez acaba atuando sobre a região amazônica. Evidências de estudos observacionais e estudos de modelagem (como por exemplo: Nobre et al., 1991; Betts et al., 1997, 2000; Chase et al., 2000; Zhao et al., 2001) demonstraram que mudanças na cobertura superficial podem ter um impacto significativo no clima regional e global. Evidências de trabalhos paleoclimáticos e de modelagem indicam que essas mudanças na vegetação, em alguns casos, podem ser equivalentes àquelas devidas ao aumento do CO2 na atmosfera (Pitman and Zhao, 2000).
Variações climáticas decorrentes das mudanças climáticas globais provocadas por ações antrópicas.
Se as tendências de crescimento das emissões se mantiverem, os modelos climáticos indicam que poderá ocorrer aquecimento até acima de 6ºC em algumas regiões do globo até o final do século XXI. É provável que a temperatura média global durante o século XXI aumente entre 2,0ºC a 4,5ºC, com uma melhor estimativa de cerca de 3,0ºC, e é muito improvável que seja inferior a 1,5ºC. Valores substancialmente mais altos que 4,5ºC não podem ser desconsiderados, mas a concordância dos modelos com as observações não é tão boa para esses valores (IPCC, 2007). Conclui-se que, mesmo no cenário de baixas emissões de gases do efeito estufa (cenário B1), as projeções dos diversos modelos do IPCC indicam aumento da temperatura, sobretudo no Hemisfério Norte.
Recentemente Ambrizzi et al. (2007), utilizando três modelos regionais que foram integrados numericamente para a América do Sul, a partir de dados iniciais obtidos do modelo climático global do Hadley Centre, concluíram que para o período 2071-2100, em relação ao período 1961-1990, o maior aquecimento ocorrerá na Amazônia com aquecimento entre 4-8ºC para o cenário A2 de emissões de gases de efeito estufa e de 3-5ºC para o cenário B2. Em relação à precipitação, o cenário B2 apresenta diminuição da precipitação no norte e em parte do leste da Amazônia, enquanto que o cenário A2 apresenta diminuição da precipitação no norte, leste e região central da Amazônia.
A partir do Relatório da Quarta Avaliação do IPCC (IPCC 2007), há maior certeza nas projeções dos padrões de aquecimento e de outras características de escala regional, inclusive das mudanças nos padrões do vento, precipitação e alguns aspectos dos eventos extremos e do gelo. A associação entre eventos extremos de tempo e clima observados e as mudanças do clima é recente. As projeções do IPCC (2007) indicam um maior número de dias quentes e ondas de calor em todas as regiões continentais, principalmente em regiões nas quais a umidade do solo vêm diminuindo. Há ainda projeções de aumento da temperatura mínima diária em todas as regiões continentais, principalmente onde houve retração de neve e de gelo. Além disso, dias com geadas e ondas de frio estão se tornando menos freqüentes.
De acordo com o IPCC (2007), o aquecimento global pode levar a mudanças nos padrões de variabilidade de grande escala oceânica e atmosférica. Por exemplo, as projeções de diversos modelos indicam eventos El Niño-Oscilação Sul (Enso) mais intensos e há evidências observacionais que suportam essa projeção (Boer et al., 2004). O Enso está associado com algumas das mais pronunciadas variabilidades interanuais dos padrões climáticos em muitas partes do mundo.
AQUECIMENTO GLOBAL, VARIABILIDADE NATURAL E EL NIÑO
As análises de diversos modelos climáticos globais indicam que com o aumento da temperatura global, devido ao aumento dos gases do efeito estufa, o clima do Pacífico tenderá a ficar parecido com uma situação de El Niño (Knutson and Manabe, 1995; Mitchell et al., 1995; Meehl and Washington, 1996; Timmermann et al., 1999; Boer et al., 2000). Entretanto, as razões para tal semelhança são variadas, e dependem da representação de processos físicos e parametrizações nos modelos (IPCC, 2007).
Para a Amazônia, estudos como Ropelewski and Halpert (1987, 1989), Marengo (1992, 2004), Uvo et al. (1998), Ronchail et al. (2002) e muitos outros identificaram que anomalias negativas de precipitação no centro, norte e leste da Amazônia são em geral associadas com eventos de El Niño-Oscilação Sul (Enso) e anomalias de TSM no Atlântico tropical. Esses estudos ressaltaram que algumas das maiores secas na Amazônia foram devidas a: 1. a ocorrência de intensos eventos de El Niño; 2. forte aquecimento das águas superficiais do Atlântico tropical norte durante o verão-outubro no Hemisfério Norte; ou 3. ambos (Marengo et al., 2007). A variabilidade das anomalias de TSM no Pacífico tropical é responsável por menos de 40% da variabilidade da precipitação na bacia amazônica (Marengo, 1992; Uvo et al., 1998; Marengo et al., 2007), o que sugere que os efeitos de outras fontes de variabilidade, tais como o gradiente meridional de TSM no Atlântico intertropical (que afeta principalmente a região norte e central da Amazônia), ou processos de superfície e grande freqüência de transientes do Atlântico Sul (importante para o sul da Amazônia) podem ser também importantes na variabilidade inter-anual da precipitação na região (Marengo et al., 2003; Ronchail et al., 2002; Marengo et al., 2007).
MUDANÇAS DOS USOS DA TERRA E CLIMA
Com respeito às modificações de temperatura para a Amazônia, segundo Nobre (2001), nota-se que a projeção de aumento de temperatura global segue a mesma tendência de aumento de temperatura à superfície devido ao desmatamento. As várias simulações dos efeitos climáticos da substituição da floresta por pastagens na Amazônia (por exemplo: Dickinson e Henderson-Sellers, 1988; Shukla et al., 1990; Lean e Warrilow, 1989; Nobre et al., 1991; Henderson-Sellers et al., 1993; Manzi e Planton, 1996; Hahmann e Dickinson, 1997; Costa e Foley, 2000; Rocha, 2001; Werth e Avissar, 2002; Voldoire e Royer, 2004; Correia, 2005 e Sampaio et al., 2007) e as observações dos projetos Abracos (Gash et al., 1996; Gash and Nobre, 1997) e LBA (Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia) indicam que há um aumento da temperatura entre 0,3ºC e 3ºC, redução da evapotranspiração entre 15% e 30% e os estudos numéricos indicam redução da precipitação entre 5% e 20% devido à mudança de vegetação de floresta para pastagem. Este aumento de temperatura é comparável àquele projetado para o cenário B1, mas bem inferior àquele previsto para o cenário A2 para o final do século XXI. Provavelmente os efeitos de aumento de temperatura induzidos pelas mudanças globais e aqueles advindos dos desmatamentos se somariam, aumentando o risco de incêndios florestais porque o secamento da vegetação na estação seca e sua flamabilidade são maiores com temperaturas mais altas. (Nepstad et al., 1999).
Adicionalmente, Schneider et al. (2006) encontraram que o desflorestamento da Amazônia levaria a um aumento da variabilidade do Enso e um aquecimento médio anual no Pacífico equatorial leste. Esse aumento da variabilidade do Enso estaria relacionado com um aumento da temperatura da superfície na região desflorestada que levaria a mudanças no padrão de vento próximo à superfície, que se estenderiam até o Pacífico e Atlântico e afetariam o vento superficial sobre o oceano, com anomalias de oeste no Pacífico leste. Em resumo, para a Amazônia os aumentos projetados de temperatura atuariam como feedback positivo e aumentariam a suscetibilidade dos ecossistemas amazônicos às mudanças climáticas globais devido ao aumento do efeito estufa, e regionais devido ao desmatamento.
MUDANÇAS DOS USOS DA TERRA E HIDROLOGIA
O efeito do desmatamento e das mudanças climáticas afeta o ciclo hidrológico em todas as escalas de tempo: em escalas de tempo de dias a meses, levam a mudanças na incidência de inundações; em escalas de tempo sazonais a interanual, mudanças nas características da seca é a principal manifestação hidrológica; e em escalas de anos a décadas, as teleconexões nos padrões de circulação global atmosférica, ocasionadas pela interação oceano-atmosfera, afetam a hidrologia de algumas regiões, especialmente nos trópicos, por diferentes eventos, entre eles o El Niño (Nijssen et al., 2001). A mudança climática representa um risco para o ciclo hidrológico na Amazônia, uma vez que o aumento de temperatura provocará uma maior evaporação e maior transpiração das plantas, o que levará a uma aceleração do ciclo hidrológico (Case, 2006). Se, além disso, a precipitação diminuir durante a estação seca, o impacto das mudanças climáticas no regime hidrológico na Amazônia será ainda mais agravado (Nijssen et al., 2001). A intensa seca ocorrida, no sudoeste da Amazônia em 2005, teve fortes impactos na navegação, agricultura, geração de hidroeletricidade, e afetou de forma direta e indireta a população ribeirinha de grande parte da Amazônia (Marengo et al., 2006).
AQUECIMENTO GLOBAL E AMAZÔNIA
Desde a publicação do Terceiro Relatório de Avaliação do IPCC e particularmente para o Quarto Relatório (IPCC 2007), há uma compreensão cada vez melhor dos padrões projetados de precipitação. É muito provável que ocorra aumento da quantidade de precipitação nas altas latitudes, enquanto que reduções são prováveis na maior parte das regiões continentais subtropicais (em até cerca de 20% no cenário A1B em 2100), continuando os padrões observados nas tendências recentes. Entretanto, há ainda muita incerteza em relação às possíveis mudanças na precipitação pluviométrica em escala regional. De acordo com Li et al. (2006), os modelos climáticos globais do Intergovernmental Panel on Climate Change Fourth Assessment Report (IPPC AR4) prevêem diferentes padrões da precipitação na Amazônia sob a influência do cenário SRES A1B para a mudança climática global. Cinco de onze modelos estudados prevêem um aumento da precipitação anual, três modelos prevêem um decréscimo na precipitação e os outros três não indicam padrão significativo de mudança da precipitação na Amazônia. Incertezas nos padrões previstos de mudanças na TSM no Pacífico e Atlântico tropicais, representação de nuvens e feedbacks da superfície na Amazônia são as principais fontes das incertezas na previsão de mudanças na precipitação da Amazônia. Por outro lado, as projeções do IPCC (2007) indicam que é muito provável que haja um aumento da intensidade da precipitação em diversas regiões, sobretudo na região tropical. Além disso, há projeções de secas generalizadas em regiões continentais durante o verão.
Na Amazônia, a precipitação é sensível às variações sazonal, interanual e decadal da TSM (Fu et al., 2001; Liebmann and Marengo, 2001; Marengo, 2004). O aquecimento do Pacífico tropical leste durante eventos El Niño suprime a precipitação da estação chuvosa através da modificação da circulação de Walker (leste-oeste) e via os extratrópicos no Hemisfério Norte (Nobre and Shukla, 1996). Variações na precipitação da Amazônia são também conhecidas por estarem relacionadas às TSMs no Atlântico tropical (Liebmann and Marengo, 2001). Um aquecimento do Atlântico tropical norte relativo ao sul leva a uma mudança para o norte e oeste da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) e subsidência compensatória sobre a Amazônia (Fu et al., 2001). As TSMs no Atlântico também exercem uma grande influência na precipitação da estação seca (julho-outubro) no oeste da Amazônia pelo atraso no início da Monção da América do Sul (Marengo et al., 2001; Harris et al., 2006).
Eventos extremos, como a seca de 2005 no oeste e sudoeste da Amazônia, num cenário futuro de aumento de CO2 e diminuição de aerossóis, podem se tornar mais freqüentes. É provável que um aumento na temperatura da superfície do mar no Atlântico norte tropical tenha sido a causa da seca de 2005 na Amazônia, já que havia a ausência de episódio El Niño. Isso implicou numa diminuição da intensidade dos ventos alísios de nordeste e do transporte de umidade do Atlântico tropical em direção a região amazônica. Segundo Marengo et al. (2007) as causas da seca ocorrida na Amazônia em 2005 não estão relacionadas ao El Niño, mas a três possíveis fatores: (1) o Atlântico norte tropical anomalamente mais quente do que o normal, (2) a redução na intensidade do transporte de umidade pelos alísios de nordeste em direção ao sul da Amazônia durante o pico da estação de verão, e (3) a diminuição do movimento vertical sobre esta parte da Amazônia, resultando num reduzido desenvolvimento convectivo e reduzida precipitação. Esses três fatores são dinamicamente consistentes na medida que águas mais quentes no oceano Atlântico tropical norte induziriam movimentos ascendentes atmosféricos sobre essa região, com abaixamento da pressão atmosférica, e movimentos descendentes compensatórios sobre a região da seca no oeste-sudoeste da Amazônia, e conseqüente aumento da pressão atmosférica. Esse padrão de anomalias de pressão reduziria a intensidade dos ventos alísios transportando umidade do oceano para a Amazônia.
VARIABILIDADE CLIMÁTICA E INCÊNDIOS FLORESTAIS
Quando a floresta é sujeita a períodos anomalamente secos, aumenta a probabilidade de ocorrência de queimadas que podem destruir centenas de milhares de hectares de floresta e injetar na atmosfera grandes quantidades de fumaça e aerossóis que poluem o ar em extensas áreas, afetando a população e com potencial de afetar o início da estação chuvosa e a quantidade de chuva na região (Andreae et al. 2004). Considerando os cenários de mudança climática do modelo do HadCM3 para o IPCC/AR4, a duração da estação seca poderia aumentar em até dois meses ou mais na maior parte da Amazônia, o que levaria ao aumento da estação seca dos atuais 3-4 meses para 5-6 meses na Amazônia central e oriental. Esse aumento da estação seca implicaria num aumento do risco da ocorrência de queimadas e mudança na climatologia da chuva o que favoreceria a substituição da floresta por savana (Li et al., 2006). Esses impactos ecológicos afetam a possibilidade de manejo sustentável da floresta na região, o que é uma premissa básica para a economia regional (Brown et al., 2006).
O risco dos impactos das mudanças climáticas na Amazônia aumenta ainda mais quando somamos ao aquecimento global as alterações de vegetação resultantes das mudanças dos usos da terra, notadamente os desmatamentos das florestas tropicais e dos cerrados.
Um outro fator importante é o fogo, pois a floresta densa amazônica era praticamente impenetrável ao fogo, mas devido à combinação da fragmentação florestal, desmatamentos e aquecimento em razão dos próprios desmatamentos e devido ao aquecimento global, aliada a prática agrícola predominante que utiliza fogo intensamente, esse quadro está rapidamente mudando e a freqüência de incêndios florestais vem crescendo a cada ano. Com isso, é quase certo que acontecerão rearranjos importantes nos ecossistemas e mesmo redistribuição de biomas. A assombrosa velocidade com que tais alterações estão ocorrendo, em comparação àquelas dos processos naturais em ecossistemas, introduz séria ameaça à mega-diversidade de espécies da flora e da fauna dos ecossistemas, em especial da Amazônia, com o provável resultado de sensível empobrecimento biológico (Nobre et al, 2005).
MUDANÇAS CLIMÁTICAS, BIOMAS E BIODIVERSIDADE
Segundo Nobre (2001), para a Amazônia, se houver redução de precipitações induzidas pelas mudanças climáticas globais, estas se somam às reduções previstas como resposta ao desmatamento (Nobre et al., 1991), aumentando sobremaneira a suscetibilidade dos ecossistemas amazônicos ao fogo e causando a redução das espécies menos tolerantes à seca, podendo até induzir uma "savanização" de partes da Amazônia. Para a América do Sul tropical, tomando-se uma média dessas projeções de aumento de temperatura, constata-se a projeção do aumento da área de savanas e uma diminuição da área de caatinga no semi-árido do Nordeste do Brasil. Salazar et al. (2007) calcularam, utilizando cenários climáticos de 15 modelos climáticos globais do IPCC-AR4, as áreas onde o consenso dos modelos (> 11 modelos) indicam mudanças nos biomas na América do Sul tropical nos cenários A2 e B1 de emissões de gases de efeito estufa. Para o período 2020-2029, 3.1% da floresta tropical seria substituída por savana, e para finais do século (2090-2099) a área que será substituída aumenta para 18% no cenário A2. Esta mudança nos biomas, devido ao aquecimento global, ocorre principalmente no sudeste da Amazônia, região esta que coincide com uma zona que teoricamente apresenta dois estados de equilíbrio vegetação-clima: 1. o primeiro que corresponde ao padrão de vegetação atual com a maior parte da Amazônia recoberta por floresta tropical e 2. um segundo estado de equilíbrio, onde a parte leste da Amazônia é substituída por savanas (Oyama e Nobre, 2003). Isso tem repercussões muito importantes, já que a mudança climática pode ser um dois fatores que poderiam levar o sistema de um estado de equilíbrio para outro no leste da Amazônia. Outros estudos também apontam para redução das áreas de floresta (White et al., 1999; Cramer et al., 2001; Scholze et al., 2006; Cook and Vizy, 2007) ou seu completo colapso (Jones et al., 2003; Cox et al., 2004)
Em Scholze et al. (2006), o risco de perda da floresta em algumas partes da Amazônia é de mais de 40% para os cenários que apresentam uma anomalia de temperatura maior que 3ºC. Por outro lado, se houver tendência ao aumento das precipitações, estes atuariam para contrabalançar a redução das chuvas devido ao desmatamento e o resultado final seria mais favorável à manutenção dos ecossistemas e espécies.
Adicionalmente, alguns estudos têm mostrado que o estômato da planta abre menos com altas concentrações de CO2 (Field et al., 1995), o que reduz diretamente o fluxo de umidade da superfície para a atmosfera (Sellers et al., 1996). Isto pode aumentar a temperatura do ar próximo da superfície pelo aumento da razão entre o fluxo de calor sensível e fluxo de calor latente. Numa região como a Amazônia, onde muito da umidade para a precipitação advém da evaporação à superfície, a redução da abertura estomatal pode também contribuir para um decréscimo na precipitação (Betts et al., 2004).
Se grandes áreas da Amazônia forem substituídas por savana, a aridez poderá aumentar já que a vegetação adaptada ao fogo tem uma menor transpiração. Em Scholze et al. (2006) conclui-se que é provável uma maior freqüência de fogo (risco > 60% para temperatura > 3ºC) em muitas zonas da América do Sul. Em Hutyra et al. (2005) é mostrado que as florestas presentes em áreas com alta freqüência de secas (> 45% de probabilidade de seca) podem mudar para savana, se a aridez aumentar como previsto pelos cenários de mudança climática (Cox et al., 2004; Friedlingstein et al., 2003). Portanto cerca de 600.000 km2 de floresta estarão em potencial risco de desaparecer (> 11% da área total vegetada).
A floresta amazônica contém uma grande parte da biodiversidade do mundo, pois mais de 12% de todas as plantas com flores são encontradas na Amazônia (Gentry, 1982). Sendo assim, ameaças à existência da floresta amazônica indicam sérias ameaças à biodiversidade. Entretanto, existem poucos estudos sobre os efeitos das mudanças climáticas na distribuição de espécies. Em nível global, Thomas et al. (2004) avaliaram o risco de extinção de espécies para áreas que cobrem cerca de 20% da superfície terrestre, e encontraram que entre 15% e 37% das espécies estariam comprometidas com risco de extinção até o ano de 2050. Em nível regional, as simulações de Miles et al. (2004), baseando-se nos cenários futuros do HADCM2Gsa1 (que assume um aumento anual de 1% na concentração de CO2), mostraram que 43% do conjunto de espécies arbóreas analisadas na Amazônia seriam não-viáveis para o ano de 2095. Para que as espécies afetadas possam atingir novas zonas bioclimáticas, a dispersão e migração deverão ser feitas em centenas de quilômetros (Hare, 2003). Muitos desses experimentos de modelagem não têm considerado as influências não-climáticas como as mudanças do uso da terra, o desmatamento, a disponibilidade de água, as pestes e doenças, queimadas, e todas as outras que possam limitar a migração e dispersão de espécies (Case, 2006). No trabalho de Sala et al. (2000), estudou-se a mudança na biodiversidade para o ano 2100, considerando alguns desses aspectos e identificou-se que, para os biomas tropicais, os principais agentes que afetam a biodiversidade são o uso da terra e as mudanças climáticas.
CONCLUSÃO
A Amazônia vem sendo submetida a pressões ambientais de origem antrópica
crescentes nas últimas décadas, tanto pressões diretas advindas dos desmatamentos e dos incêndios florestais, como pressões resultantes do aquecimento global. A estabilidade climática, ecológica e ambiental das florestas tropicais amazônicas está ameaçada por essas crescentes perturbações, que, ao que tudo indica, poderão tornar-se ainda maiores no futuro. A ciência ainda não consegue precisar quão próximos estamos de um possível ponto de ruptura do equilíbrio dos ecossistemas e mesmo de grande parte do bioma Amazônico, mas o princípio da precaução nos aconselha a levar em consideração que tal ponto de ruptura pode não estar distante no futuro. Um colapso de partes da floresta tropical trará conseqüências adversas permanentes para o planeta Terra.
Carlos A.Nobre, Gilvan Sampaio, Luis Salazar são pesquisadores do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)